Era uma
vez uma quinta onde havia um bonito galinheiro, tinha uma rede novinha, era
limpo diariamente e comida não faltava. O dono era esmerado, muito orgulhoso
das suas aves, tratava-as com carinho até, elas eram suas e davam-lhe dúzias de
ovos. As aves maiores punham ovos grandes e deliciosos.
Um dia,
encontrou nos terrenos da quinta uma ave bebé, maior do que as suas, estava
caída, inconsciente. O quinteiro olhou para ela e esfregou as mãos de contente
imaginando o belo ovo que ela lhe poderia dar. Levantou-a com cuidado, tratou-a
e colocou-a no seu galinheiro.
No dia
seguinte, a nova ave despertou e começou a movimentar-se agitadamente no
galinheiro, era um espectáculo horrível para o quinteiro: penas por todo o
lado, comedouros entornados, galinhas assustadas, e como se não bastasse, nem
um ovo!
Pelo fim
da tarde, entrou convictamente no galinheiro e amarrou as asas da grande ave.
Pensou amarrar as patas e o bico, mas temeu que se ela não se alimentasse nunca
lhe desse o grande ovo.
Com o
passar dos dias, a grande ave foi desistindo do seu estranho comportamento e,
depois de muito tempo sem comer, imitou as outras e bicou o chão com
dificuldade para juntar o milho.
Um belo
dia, o quinteiro até pensou ver o grande ovo, mas fora engano seu. Foi-se
esquecendo da grande ave e já nem dava pela sua presença.
Dias
havia em que a grande ave parecia querer voltar a libertar-se, bicava
desesperadamente a rede do galinheiro e parecia gostar de assustar as outras
que se punham a um canto. Então, a grande ave saboreava uma passeata solitária
pelo galinheiro como se fosse um domínio só seu. Mas tudo isto fazia sem o
quinteiro ver, para não prendê-la ainda mais.
E assim
corria a vida, até que um pequeno rato entrou no galinheiro e comeu uns grãos.
Grande alvoroço se gerou no galinheiro, o maior galo quis valer as suas
galinhas e ia matando o pequeno rato se a grande ave não lhe barrasse o caminho.
Levou umas bicadas furiosas, mas salvou o pequeno rato da morte quase certa.
Enquanto o ratinho saia da gaiola, a grande ave observava-o com alegria, pois o
ratinho podia andar lá fora e, vendo-o livre, sentia-se ela própria um pouco
mais livre, pelo menos podia sonhar com a liberdade.
O
quinteiro não lhe dava atenção, tratava-a com cordialidade porque não era um
homem mau. Mas ela nunca punha ovos… Nem se podia libertá-la, pois pensava – o
quinteiro - que ela não iria sobreviver e, na ideia dele, era melhor a
segurança e o conforto do galinheiro do que o risco de morrer.
A grande
ave sabia que o quinteiro era um homem bom, mas por vezes pensava em atacá-lo
para poder fugir, porque se lhe pedisse ele não a deixava ir. Então tecia
grandes planos de ataque e fuga, mas o remorso corroía-lhe a alma e ao vê-lo
aproximar-se, baixava a cabeça e recolhia-se a um canto, de costas para ele,
para que não percebesse o que lhe ia na alma.
De bom
quinteiro para boa grande ave domesticada e de boa grande ave domesticada para
bom quinteiro, era assim que os dias iam passando.
Mas, um
belo dia, o pequeno rato voltou ao galinheiro, não pensava entrar, pois
lembrava-se do perigo que correra, e a comida nem valia o risco! Mas a grande
ave lá estava, que estranho! Já havia visto grandes aves daquelas, mas não num
galinheiro, voavam muito depressa e até podiam ser perigosas para ratos fora da
toca! Mas esta até o tinha ajudado, provavelmente bem mais do que podia pensar!
O pequeno rato continuou por perto, estudando a grande ave, até que viu a corda
que lhe prendia as asas… Lembrou-se das ratoeiras que vira na casa do quinteiro,
e compreendeu o olhar triste da grande ave.
O pequeno
rato lembrou-se das lições do Avô Rato, “Por vezes, é uma desvantagem ser
pequenino, por vezes é uma vantagem ser pequenino, mas nunca és pequeno demais
para realizares aquilo em que acreditas. Atreve-te!”
Assim
foi que, de noite, quando todas as aves dormiam menos a grande ave que nunca
conseguia ajeitar-se naquele lugar que não era o seu, o pequeno rato entrou no
galinheiro. Queria roer as cordas, mas não conseguia ir para trás da ave que rodopiava
em torno de si para observar o seu pequeno amigo! Então, o pequeno rato fez-lhe
companhia até que ela adormecesse e, depois, pôs-se a roer toda a noite até que
as cordas se soltaram. Feliz com o seu sucesso e orgulhoso do seu engenho saiu
do galinheiro e ficou de atalaia. Bocejava ensonado, quando raiou o dia, daí a
pouco lá estava o quinteiro a levar comida e água fresca ao galinheiro. A
grande ave acabava de acordar e parecia sentir-se estranha, sacudia-se,
agitava-se. O pequeno rato decidiu aproximar-se e depois do quinteiro entrar,
começou a passear e a rebolar na relva à frente da grande ave, sugerindo-lhe a
fuga, não fosse ela perder a oportunidade! Quando o viu, a grande ave bateu as
asas de satisfação e, aí, compreendeu porque se sentia diferente e estranha
desde que acordara. Num ápice, percebeu o perigo e discretamente fechou as
asas.
Então, o
pequeno rato chamou a atenção do quinteiro espalhando o saco do grão. Enquanto
este perseguia o pequeno rato com a grande vassoura, a grande ave esvoaçou para
fora do galinheiro. Com medo que as galinhas a seguissem, o quinteiro abandonou
a perseguição ao pequeno rato que seguiu a ave na sua corrida desajeitada, numa
confusão de patas e de asas que não pareciam conhecer a respectiva função.
A grande
ave sentia enorme aflição, não sabia como mover-se, não sabia para onde devia
ir! Quando cansada se acalmou um pouco viu o pequeno rato ofegante correndo ao
seu lado. De imediato parou, queria agradecer-lhe, agora lembrava-se de que ele
lhe fizera companhia à noite, que o seu sono fora profundo e leve, que ao
acordar tinha as asas soltas e que quando o quinteiro abrira a porta tinha
podido fugir. E o pequeno rato era o ser mais pequeno que conhecia!
O
quinteiro não tinha vindo atrás de si! Claro, nunca lhe dera o belo ovo! Só
continuava a tratá-la, porque não sabia o que fazer com ela. Entretanto, o pequeno
rato pôs-se a andar à sua frente, distraidamente, sem saber o que mais fazer, a
grande ave seguiu-o.
Primeiro,
o pequeno rato levou-a a um campo de milho, onde ambos comeram, depois,
continuaram a jornada, ele andando, ela esvoaçando, rumo às grandes montanhas.
Passados
uns dias, estavam bem perto da montanha mais alta. O pequeno rato olhou para o
céu e esperou. A grande ave observava-o. Subitamente, o pequeno rato agitou-se,
olhou de novo para o céu onde uma grande ave voava em grandes círculos. De
repente o pequeno rato pareceu enlouquecer e desatou aos pinotes e a correr
velozmente. A grande ave do céu parou no seu voo com as enormes asas abertas, rapidamente
fechou as asas e começou a cair em direcção ao pequeno rato! Grandes garras
agarraram o frágil corpo do pequeno rato e a grande ave da terra viu o seu
pequeno amigo desaparecer rumo aos céus. Em fúria agitou as asas, esticou o
pescoço querendo alcançar a outra grande ave, correu um pouco e, subitamente,
como se a força do seu querer lhe desse asas, elevou-se no ar e contendo a
emoção bateu as asas como se sempre as tivesse usado assim!
Perseguiu
a grande ave do céu até ao ninho para onde levara o pequeno rato, descobriu-o
quase sem vida… Mas os pequenos olhos ainda brilhavam e, se ele não fosse um
pequeno rato e ela uma grande ave da terra que era afinal do céu, pensaria que
havia lágrimas de felicidade prontas a correr. Como se a linguagem dos pequenos
ratos fosse a mesma das grandes aves do céu, ouviu-o agradecer-lhe por tê-lo
inspirado e, assim, dado a oportunidade de tornar grande e gloriosa a vida de
um pequeno rato da terra que agora, através dela, poderia explorar a grandeza
ilimitada dos céus, porque oferecendo-lhe a sua vida por amor e generosidade,
ganhara ele próprio as asas que nunca tivera.
Texto de Ana Isabel Teixeira de Freitas
Bela Lição de Vida!
ResponderEliminarObg pela partilha. Continue.
É um prazer partilhar...continuarei, obg :)
EliminarQuando acabei de ler a fábula, o meu filho (Rodrigo), com um grande sorriso na cara, disse: "Lindo mamã! Adorei! Diz à Prof.ª Isabel que se esta história estivesse num livro escrito por ela, eu comprava logo!"
ResponderEliminarEsperamos por mais Prof.ª :)
Abraço Luminoso
Sara
Querido Rodrigo! Teremos sim mais histórias para contar... e contamos com leitores atentos como tu e a mamã :) Obrigada
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