05 maio 2015

Maternidade e paternidade consciente e o impacto na escola

(Escrito por Ana Isabel Freitas em 05.05.2015)
A grande questão: o que é ser boa mãe/bom pai?
Comecemos pelo exemplo dos mais novos: os filhos. Todos os filhos se esforçam, e muito, por amar os seus pais. Regra geral, os filhos amam os seus pais de uma forma mais incondicional, em crianças, do que virão a amar mais tarde, quer os pais, quer as outras pessoas.
As crianças aceitam com mais naturalidade os defeitos, as falhas e as limitações dos seus pais, revelando até, por vezes, uma certa “cegueira” em relação a essas imperfeições ou tendência para subvalorizar. Não ver para não sofrer, não ver para continuar a amar e a inspirar amor.
Na verdade, este amor da criança pelos pais ainda não é o verdadeiro amor, porque carece de consciência. É uma mescla de necessidade, de dependência, na luta pela sobrevivência que forja afetos com maior ou menor fundamento ou motivação real.
No entanto, esse investimento da criança, em cultivar o amor pelos pais e em inspirá-los a amá-la, cumpre a sua função: favorecer a manutenção do vínculo afectivo forte e apelar para o sentido de responsabilidade que assegure a função da parentalidade.
Do outro lado, a mãe e o pai, com a chegada da criança, instintivamente, pelo menos, despertam a vontade de amá-la e de cuidá-la. Contudo, a força deste instinto tem-se perdido com o aumento do egocentrismo típico de uma sociedade em que cada indivíduo é antes de mais um consumidor voraz e um buscador ávido de prazeres materiais e fáceis.
Na ausência de valores éticos e na vigência de uma moralidade cada vez mais falsa, desvirtuada e decrépita, pais egocêntricos capitulam enquanto pais e votam as suas crianças ao abandono. As crianças são “depositadas” nas escolas, onde os professores e o pessoal auxiliar as cuidam como podem. Chegam famintas de tudo: de alimento e de afeto. Chegam cheias do que não interessa: maus hábitos; agressividade e desconfiança.
A escola, em termos organizacionais é, em geral, profundamente inadaptada às necessidades e ao funcionamento das crianças da nossa era, mesmo que estas chegassem à escola nas devidas condições, ou seja, amadas e educadas pelos seus pais.
Eis como a parentalidade (maternidade/paternidade) e a escola se tornaram “locus horrendus” na nossa sociedade.
E como se não bastasse, ainda nos deparamos com uma cidadania inconsciente, não participativa nem responsável forjando governos corruptos e incompetentes que depauperam o erário público e endividam o Estado de modo desproporcional à pouca riqueza que geram, legando às gerações vindouras uma dívida totalmente injusta por ser anterior à sua chegada e não os favorecer no seu crescimento e desenvolvimento.
Que futuro preparamos para a Humanidade?
Voltando aos pais, que são o alvo primeiro desta reflexão que partilho, o seu compromisso com a criança também não se cumpre, quando não investem no seu próprio desenvolvimento e no seu crescimento pessoal.
O maior tesouro que podemos legar aos filhos é não sobrecarregá-los com os nossos defeitos, limitações e falhas. É nossa responsabilidade não onerar a vida dos nossos filhos com tudo o que, por inconsciência, indisciplina, preguiça e orgulho, nos recusamos a trabalhar em nós.
Como espelhos que são, pela sua pureza original, e como “macaquinhos de imitação”, seres que essencialmente aprendem pelo exemplo, os nossos filhos, desde muito cedo, manifestarão a “marca” dos pais que têm.
Se as nossas crianças são rebeldes, malcriadas, indisciplinadas, agressivas e tudo o mais que não se quer, é porque os seus pais não estão a trabalhar como deviam, nem em si mesmos, nem com os filhos.
E porque me dei ao direito de tocar em tantas feridas da nossa sociedade, quero contribuir para tratá-las como é justo e devido.
Que a minha visão crítica seja inteiramente construtiva e que os que me lêem, mais não seja pelo amor aos seus filhos e às crianças da Terra, saibam calar o demónio do ego que já os atenta com invectivas sobre mim e possam começar, calando o ego, a cuidar do seu crescimento.
Aos pais, aconselho a observaram e reflectirem sobre o que não gostam nos seus filhos, para saberem o que está mal em si mesmos, devendo abster-se de culpabilizar o outro progenitor. Pois, ainda que num particular a criança se assemelhe mais a um do que a outro, continua a ser filha de ambos que se escolheram ou aceitaram como parceiros no projecto “não divorciável” que é a criança.
No projecto “criança”, os pais obrigaram-se “para todo o sempre” a cooperar. Quando os egos dos pais estão em luta, as crianças ficam esquecidas. O progenitor que as ama, poupa-as, ainda que à custa de sacrifício que considere justificado.
Podemos ser bons pais, ainda que seres imperfeitos. Mas não podemos ser bons pais, se não tivermos aspiração à perfeição.
Sobre a transformação da educação e da escola, o que proponho?
Quando os pais forem conscientes, exigirão escolas diferentes e cooperarão para que as escolas democráticas e humanistas (1) sejam realidade.
Enquanto as escolas tardam em mudar, sejam vocês, os pais, a fazer a ponte, ajudando os vossos filhos a suportar o “peso” da escola e a relativizar todos os falsos conceitos e as orientações prejudiciais que a escola lhes dê. Sempre que possível, dialoguem com os professores (2).
Aos professores e aos pais, recomendo que estejam atentos ao que se está a passar mesmo na vossa vizinhança. Novos projectos querem vingar, sementes trazidas por ventos de mudança.
Agora é o momento para saber quem quer a mudança verdadeiramente, pois aqueles que querem a transformação das escolas não ficarão de braços cruzados nem deixarão o combóio passar.
Deixo o link da Rede Educação Viva ( http://www.educacaoviva.pt/ ) para aqueles que já compreenderam que as coisas importantes não aparecem nos noticiários da televisão nem mesmo na maior parte dos jornais. É preciso estar atento e aberto à mudança. Se assim for, a informação chegará.
Que uma nova consciência desperte nos pais e nos professores e que a missão de educar volte a ter a nobreza que nunca devia ter deixado de ter!


(1)  – Nas escolas democráticas, todos são envolvidos nas decisões de organização e gestão da escola. As escolas humanistas respeitam a forma natural de desenvolvimento e de aprendizagem do ser humano, formando seres autênticos, felizes e com capacidade de realização pessoal.

(2)  – Precisamente enquanto escrevia este texto, uma aluna pedia conselho sobre como orientar o filho cujas notas de matemática haviam descido devido à manifesta excessiva exigência do programa. O meu conselho não agradaria a alguns professores, mas pode ter feito uma criança mais feliz e ajudado a salvaguardar o seu futuro.